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  • Foto do escritorTeresa Gomes

Vamos às Vindimas - Conversas com Enólogos - Parte Um

Este foi o nome de uma série de conversas em directo no Instagram que aconteceram entre 16 de Agosto e 28 de Setembro. Todas as Terças-feiras à noite Enólogos e Enólogas partilharam relatos fascinantes da vindima de 2021 em directo.


Ficamos a saber como é o dia-a-dia intenso da vida destes Enólogos durante a vindima.

Tomamos conhecimento das decisões inacreditáveis que têm de tomar na vinha e na adega.

Além do vinho que aspiram fazer ou qual a quinta produtora de vinhos que recomendam visitar.




Com os Enólogos convidados fomos às vindimas ao Alentejo, Tejo, Trás-os-Montes, Lisboa, Península de Setúbal, Bairrada, Vinho Verde, Dão, Beira Interior e Douro. Ainda houve tempo para um saltinho a Espanha e relembrar memórias de África do Sul.


Desta forma, os artigos ao longo das próximas quinzenas, vão ser igualmente uma série com o resumo das conversas Vamos às Vindimas.



Enóloga convidada - Joana Pinhão

A primeira conversa aconteceu a 16 de Agosto e convidei a Enóloga Joana Pinhão.

Natural de Alpiarça, cresceu numa família profundamente ligada à vinha e ao vinho.

Em 2002 foi estudar para o Instituto Superior de Agronomia (ISA) em Lisboa.


Durante a Especialização em Enologia estagiou primeiro na Casa Cadaval (Tejo) e mais tarde, ainda como estagiária na Quinta Vale Dona Maria (Douro) onde ficou como Enóloga.

Ainda no Douro tem o seu nome associado aos vinhos da Quinta da Ferradosa, Quinta das Brolhas e um projecto pessoal - Somium (vinhos biológicos).


Em 2009 e 2010 colaborou com Cristiano Van Zeller na produção de vinhos em Espanha na região do Toro e em 2012 fez uma breve passagem pela África do Sul durante a vindima desse ano.

Em 2015 começou a recuperar as vinhas no Casal das Aires, projecto familiar na região do Tejo. Em 2019 surgiram os primeiros vinhos de Chardonnay e Pinot Noir.

Nos últimos dois anos abraçou novos projectos: Quinta Vale Madruga (Trás-os-Montes); Quinta da Barca (Douro); Casa Clara (Alentejo).

Douro » considera a região mais difícil de vindimar em Portugal;

2021 » ano de estreia a vinificar Espumante Natural (Quinta da Barca no Douro).

Relatório de vindima 2021

Inicio: 8 de Agosto no Alentejo

Fim: provavelmente Outubro no Douro, Vinho do Porto

Foi um ano difícil com uma Primavera chuvosa.

Houve doenças durante todo o ciclo, muito míldio o que originou quebra na produção. Porem os cachos que ficaram na vinha mostram boa qualidade.


Até 16 de Agosto “a vindima tem sido tranquila, uvas excepcionais, produção equilibrada (Alentejo). Na região do Tejo o calor destes dias acelerou as maturações.”

Conversa #1 Vamos às Vindimas


Quando começas a “desenhar” os vinhos? Como te inspiras nesse processo?

Provar os vinhos das colheitas anteriores e perceber o que é preciso fazer na vinha e adega para obter o mesmo estilo.

Em projectos novos, há sempre o ano zero. É preciso experimentar e se resultar, melhorar nos anos seguintes.


A vindima, a qualidade da uva é o mais importante. Assim a tarefa na adega fica facilitada, não haverá surpresas. Depois é apenas a elaboração dos lotes (blends).


Na adega como é feito o “blend”?

Quando as uvas são de vinhas velhas naturalmente o lote está feito. Acontece em muitos dos vinhos da Quinta do Vale Dona Maria. Gosto de trabalhar com vinhas velhas.

Outro exemplo, no vinho Vinha Francisca há uma co-fermentação para obter maior homogeneidade do lote. É preciso conhecer o estilo que a vinha dá ao vinho. E gosto que as pessoas quando provam identifiquem o vinho e a vinha.


Já os vinhos de lote é muito o estilo que quero apresentar, posso ter uma acção mais cirúrgica.

Muitos enólogos fazem o “blend” após a fermentação malolactica. No meu caso faço sempre após o estágio e uns meses antes do engarrafamento. Entretanto, fica em inox para ficar completamente integrado.

Na tua opinião qual é a característica mais importante que um vinho deve ter?

Frescura, sei que está em voga… Vinhos mais frescos, que deem mais prazer a beber. Também vinhos equilibrados. A acidez é fundamental nos brancos.

Ao provar os vinhos à temperatura ambiente (20.ºC) os vinhos revelam-se, faz-se um raio-X ao vinho. A temperatura baixa esconde muito... Importante fazer isto quando se faz os lotes.


Como determinas se o vinho é para consumo ou guarda? E como o apreciador de vinhos pode saber identificar?

Tomo a decisão com base no vinho que está na adega. Nem todos os vinhos têm profundidade de boca, complexidade e acidez para a guarda. Sem acidez a longevidade fica comprometida. Tem de estar lá e ser vincada para dar longevidade na garrafa.

Já o álcool é relativo. Afinal os vinhos das décadas de 60/70 tinham apenas 12% e ainda aí andam. Vinhos de guarda são vinhos para correr a maratona e estarem cá daqui a 30–40 anos.

Já vi que aprecias vinhos com acidez. Quais são as castas Portuguesas naturalmente mais ricas em acidez?

A Arinto, Rabigato. Nas tintas a Sousão, Alicante Bouschet e gosto muito da Tinto Cão

Curisoamente a Sousão no Douro sofre com o calor, sobretudo quando virada a sul. E por isso alguns produtores optam pela Alicante Bouschet que é aliás possível de encontrar em vinhas velhas

Fala-nos um pouco do projecto no Tejo - Casal Aires

Tenho plantado 500 pés de Pinot Noir e 1100 pés Chardonnay. Gosto destas castas na sua origem, a região da Borgonha em França- Lá têm a sua expressão máxima.

A região do Tejo não tem nada a ver com Borgonha e não tenho intenção de fazer vinhos estilo borgonhês. Quero mostrar que no Tejo estas castas podem dar vinhos com frescura e transportar-nos para as características do Pinot Noir e Chardonnay.

Para isso é preciso vindimar mais cedo. Habitualmente na região a Chardonnay vêm em lote com a Arinto pela falta de acidez. Logo tenho de ter muita atenção ao momento da vindima.


Este ano será a quarta vindima no Casal das Aires.


Ter plantado Pinot Noir é casmurrice. O primeiro, colheita de 2018 fiz sem engaço. É um vinho com muita fruta e mais simples. Em 2019 já usei um pouco de engaço e em 2020 porque ele estava bastante maduro usei quase 100%. Saiu um vinho com mais nervo, mais tanino, mais terroso. Apenas 500 garrafas.

Em Lisboa a distribuição é feita pela Garrafeira Nacional e no Porto está na Garage Wines.


Qual é a tua opinião sobre os vinhos Biológicos?

Os Vinhos Biológicos de mínimo de intervenção é a tendência. Os herbicidas vão acabar por ser banidos do mercado e substituídos por tratamentos biológicos, com base em cobre e enxofre.

Há regiões que sair dos tratamentos convencionais vai ser difícil. Produzir em modo biológico tem de haver uma consciencialização de perda de produção. Para quem é produtor de uvas, será difícil.

A certificação é importante para a garantia, só dizer que é biológico não é suficiente.


Queres dar alguns exemplos?

A vinha é a parte mais importante, a vinha tem de estar plantada num espaço delimitado, não pode estar ao lado de uma vinha convencional. Tem de haver uma separação física.

Depois na adega usar produtos, por exemplo, leveduras, nutrição, etc., certificados para biológico. Nos catálogos já há muito opção de produtos certificados.

É importante para a sustentabilidade, os recursos não duram para sempre.

É possível perante dois copos de vinho identificar o vinho Biológico?

Ao fazer-se vinho biológico com fermentações espontâneas, será no final um vinho mais fiel ao perfil das castas e à sua origem. Será também mais contido no perfil aromático, logo menos exuberantes.

Acontece que por vezes usam-se leveduras selecionadas. É uma garantia, não sou fundamentalista.

Quando é preciso garantir que aquela levedura leva a fermentação até ao fim, sobretudo quando houve problemas fitossanitários na vinha. Ou quando a uva chega à adega com um álcool provável de 15 ou 16 graus.


É importante sim que a levedura não altere o perfil do vinho. Não ponha um vinho de Touriga Nacional a cheirar a Touriga Franca.


Vinhos naturais são todos péssimos, não é verdade. Vinho trabalhados, são maus. Há espaço para todos. O objectivo é fazer bom vinho.
É preciso trabalhar no equilíbrio, na vinha e na adega. Fazer muito com menos, com o menor custo possível, é o ideal. Quem vive só disto tem de fazer o vinho bem feito, o melhor possível.

A pandemia veio alterar as formas da venda dos vinhos. Os produtores começaram a fazer mais contas ao custo da produção. O mercado de exportação colmatou algumas falhas do mercado nacional. Quem dependia da restauração e garrafeira foi mau. Excepto para quem está na grande distribuição.


Se pudesses escolher fazer um vinho em qualquer região do mundo qual seria e porquê?

Borgonha para tentar fazer um Chardonnay e Pinot Noir perfeitos


Qual é o teu vinho preferido produzido por outra enóloga?

Os vinhos Guru e Manuela Vinhas Velhas. No Douro trabalhei muitos anos com a Sanda Tavares e ela juntamente com o Jorge Serôdio Borges (Wine & Soul) fazem grandes vinhos.


Qual é a quinta produtora de vinhos que recomendarias para passar um fim de semana?

Sem dúvida a Herdade da Malhadinha Nova. Tem tudo! Vinho, comida e enoturismo fora de série. Onde faço vinhos a Quinta da Ferradosa no Douro tem visitas, provas e um pequeno turismo rural e no futuro no Ermo (Casa Clara) no Alentejo também haverá unidade de enoturismo.


Esta conversa - Vamos às Vindimas, aconteceu a 16 de Agosto de 2021. Gravação disponível aqui.



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